segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

O Nevoeiro da Raiz


      A briga entre o passado, eu próprio e o presente persiste. Percebe-se em momentos surpresa, mas na maior parte do tempo esconde-se através de um nevoeiro espesso em frente dos meus olhos. E, surge em manobras ziguezagueadas vindas dos cantos esconsos do meu entendimento, empurrando-me para realidades clarificadas que todos compreendemos. No entanto, tenho dificuldade em percebe...r o trajeto para ali chegar e resisto à medida de conservar o conforto daquilo mostrado aos olhos de todos sem buscarmos uma perspectiva própria e límpida de sombras.
      Percorri o caminho de lá atrás até aqui para hoje apoiar os sentidos no discernimento sobre quem somos, de onde venho, para onde me empurram e sobretudo para onde pretendo ir!
      A graduação do meu entendimento tem vindo a elevar-se sem ter dado a importância que se admite. Inicialmente agradeci aos mortos terem-me permitido dar seguimento ao trilho na busca pela iluminação. Agora estou na expectativa, naquele limbo entre o querer e o não conseguir, quantificar a virtude por ter participado na peugada de alguns e ver hoje que, foi um privilégio ter assistido às escolhas e aos receios de vida futura.
      O suor converteu-se em lágrimas escondidas. Aclareou o juízo sobre o que nos move e impele a estar entre dois mundos em dois tempos distintos. A frustração persegue-me desde ontem até hoje, mas ela não sabe que os seus dias findam e a certeza efémera tomar-lhe-á o lugar. A inquietação será o motor para ascender ao patamar seguinte do conhecimento sem esquecer a raiz e sabendo que ninguém sai donde sente paz.
      O regresso vem acontecendo paulatinamente sem eu mesmo saber ou querer saber até onde é possível ir. Sei que devo ir e quero ir. Para onde? Encontrar-me-ei precisamente no lugar onde me sinta eu. E, aí será junto da minha identidade, da língua que entenda, dos olhares penetrantes e justos, da mão calejada pelo pau da vida e das dores partilhadas da alma. Aí estarei…

terça-feira, 20 de agosto de 2013

OPINIÃO - O Esforço pelo Horizonte

 O Horizonte será a linha divisora entre o trajeto traçado e a caminhada a percorrer. Este interregno de tempo é uma incógnita sobre as condições sociais, políticas e económicas de futuro.
           
            É complexo caracterizar uma reflexão irrefutável à eficiências das medidas escolhidas para arrancar o país e a sociedade do mergulho recessivo para o qual (aparentemente) nos dispusemos. Olho o conjunto dos meus compromissos e não encontro ligeireza no comportamento para prever no passado que a atualidade seria de desprezo das estruturas de governo pelos contratos (materiais e sociais) e que, após a abrupta imposição de uma nova realidade, me imputassem uma fatura endossada em segunda instância para o meu nome e que por incúria da política interna e da conjuntura globalizante olhe o espelho e por trás da primeira imagem vejo um infinito de rostos públicos e desconhecidos, totalmente responsáveis, que me empurram para a charneira da fila dos pagantes.
Aguentar é uma característica orgulhosa. A resistência acompanha o povo e se, o esclarecimento imediato pode ser-lhe uma condicionante, já o mediato é  um fortalecimento das fronteiras entre o justo e a usurpação. O constrangimento financeiro dos últimos dois anos ultrapassa as estimativas. Hoje tornou-se insuportável após o desvendar dos lucros com as ajudas dadas por alguns dominantes europeus. A continuidade no caminho restritivo e da acusação de despesismo vai ao encontro de interesses alheios e que estão camuflados pela necessidade de reformas internas.
É incontestável que a gerência das contas públicas beneficiou um grupo restrito sem ponderar a abrangência das perdas. Os poucos que acederam às vantagens procuram distorcer o rosto da responsabilidade. Porem, amanhã olharei o mesmo espelho. Os rostos serão menos desconhecidos e para que tal aconteça estarão implícitas a resiliência e a dúvida sobre o real valor do esforço. O discurso público esvazia-se a cada declaração sem que as reformas em curso se mostrem objetivas. Os retalhos das diretivas do dia-a-dia não estabelecem bases consistentes para o futuro, porque os cortes são seletivos e muitas das regalias e gastos instalados irão manter-se. Tão pouco continuam justificáveis quando a riqueza da nação é escassa e os bons exemplos de outros europeus mostram uma melhor utilização do bem público, demonstrando que o ser dirigente não descende do Olimpo.
A penetração dos interesses externos condiciona as decisões dos nossos dirigentes. No entanto, tudo isto é marcado episodicamente pelo forte descompromisso do cidadão com a representatividade através do direito/poder de voto, tão desprezado com a crescente abstenção e numa aparente ligeireza de comportamento.
É urgente que a participação individual rume no sentido da intervenção pela defesa direta do bem comum e do bom governo, o que naturalmente se traduzirá numa construção coletiva de controlo e fiscalização daqueles que nomeamos para nos representarem.

sábado, 10 de agosto de 2013

O Barbear do Rosto


A reunião de família no mês de agosto é carregada de emoções. Os fundadores deste núcleo de pessoas fora afetado pelas migrações. Estas deslocações para vários pontos do país e da Europa impregnou as nossas vidas com registos culturais que nos afastam da homogeneidade familiar mas que, nos enriquecem enquanto membros isolados dentro desta família.

A troca da boina era um momento rico de amor, partilhado entre as três gerações. Induzia o avô e os netos numa relação de cumplicidade onde o mais velho tolerava com relutância que o despojassem de um adorno acompanhante de um ano e os mais novos encontravam o motivo para darem abraços e se criar o momento desconjuntado de afastamento da dureza de alguma hierarquização no seio familiar e da aproximação por bem.

Não compreendia porque tinha de ser eu a barbear o meu avô quando tinha filhas e genros. Era-me dada a crueza de um ato que temia por considerar não estar à altura do feito. E, a possibilidade de cometer um erro ao deslizar a lâmina pelas rugas era um tormento. Porém a exposição da força humana daquele rosto à acutilância da lâmina era um voto de confiança, de cumplicidade e de grandeza para com o primeiro descente homem. A alvura dos seus pêlos escondiam o tumulto de uma vida na luta pelo legado genético e pela materialização do conforto deixado por herança como fosse esse o objetivo para esquecer as agruras e a inexistência de afetos no seu crescimento. O tormento da fome transformou-se na alavanca que hoje move os viventes que lhes foram próximos.

Tenho presente a imagem por bastião de um ancião no seu trono de pinheiro. Agnóstico convicto de que as ditas patranhas da Casa nada valem, se quem as profere não acreditar que o bem e o mal são a essência da construção humana. Sentado com o seu manto de tecido turco envolto no pescoço aguarda que a espuma se misture com os traços desgastados pelos anos da vida imensa em que, a mão trémula deste neto lhe limpe da face o registo do tempo antigo e lhe possa trazer por algumas horas o rejuvenescimento desse corpo.

A mão trémula de hoje é de saudade e de incapacidade no preenchimento do vazio, relembrado inesperadamente pela trivialidade da extração dos pêlos.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Mundos

     Os mundos que habitam em mim não cabem dentro do meu peito. Libertá-los, é contagiar os membros na caminhada. O trajeto tem amarras aos princípios da integridade que não permitem ao desvio aproveitar-se da fraqueza que envolve o corpo e que, por vezes lhe coloca uma dormência mundana e não lhe afasta a névoa antecessora da aurora. E, para alcançar o crepúsculo é incontornável o uso da força própria do inquebrável estado corpóreo da liberdade interior, da leveza da opinião própria e da resistência à oferta despida e enganadora como sombra flutuante sobre o quotidiano.
     Sentado na Pedra, escuto a pulsação cansada da luta contra os ventos de Norte e de Este. Sinto a respiração ofegante da impotência, marco um olhar fugaz de soslaio e procuro um palmo idêntico ao meu.
     Sentado. Fico e aguardo pelo momento para empurrar a persistência na busca pela moldura certa para expor a frame que carrego...

terça-feira, 2 de julho de 2013

A Luz!


Sinto que não senti no tempo certo algo que se perdeu fisicamente. Hoje, que quero senti-lo não sinto. Existe um vazio de sensação que me faz sentir empobrecido. O seu cheiro existe mas não está aqui. Foi-se para o lugar das sensações da memória onde tudo é imaginado como foi. E, aqui queria saber como foi para agora sentir-me preenchido.

Este vazio que há em mim acompanha-me por destino. Persegue-me por castigo para me obrigar a olhar o horizonte sem (deslembrar) as sombras boquiabertas como marca identitária que teimo em continuar a sentir, mesmo sabendo a dificuldade em encontrar sentimentos nesta caminhada sem sentido aparente.
Saber sentir é uma arte detida por quem olha o trajeto percorrido. Lá no limite da linha sabe... simplesmente sabe que foi para ali que quis dirigir-se e lá vai encontrar preserverantemente a luz!

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Sementes de Cravo


Olhei para a revolução do 25 de abril, um miúdo na data,  a quem dão um presente e lhe dizem que só poderia ser bom e só havia aquele para oferecer.
Durante vinte e cinco anos olhei para a obra e julguei que a geração, minha progenitora, poderia ter ido mais longe e que teria tido a oportunidade de proceder proficuamente. Achei que o facto de os cravos simbolizarem o movimento que arrastou massas se tinha tornado fraco. Por vezes substituí no meu imaginário social o cravo pela rosa na magoada sensação de que uma gota de sangue picado por um qualquer espinho acabaria por provocar o abanão final ao país.
Olhava o horizonte na tentativa de encontrar um vislumbre iluminado. Deparei-me constantemente com grilhões político-sociais de controlo confortante através dos subsídios, de amarras contratuais que subtilmente nos demovem e afastam da participação da vida sociopolítica do país e encarei-me com uma classe, feita, política interveniente ineficazmente que olhou para a aceitação eleitoral, como um objetivo superior, e permitiu esvair-se da clarividência corajosa e de ser capaz previamente de tomar as decisões certas para encarrilhar o Estado na linha onde as agulhas das receitas e das despesas se cruzariam e não chocavam.
O sete e o quinze serão números ditantes de sortes diferentes. O sete será a sombra e o calafrio deste país. Viriato Soromenho Marques poderá equivocar-se e não estaremos a ver o fim da terceira república, a menos que o governo insista em divorciar-se da população. No entanto, o primeiro-ministro alcançou a proeza de unir os trabalhadores, os sindicatos e os patrões contra as suas medidas de austeridade. O quinze é o mais importante. Representa o dia em que vislumbrei as sementes dos cravos e esqueci os espinhos da rosa. As setas contorceram-se em todas as direções e o mundo viu de que fibra é feita este povo. Entre verdades e impropérios o pacifismo popular foi revoltoso. Mãos sensuais mas fortes, sorrisos sedutores mas determinados, pés cansados mas firmes, vozes ensurdecedoras mas conectadas num só sentido presentearam os gigantes históricos que carregamos às costas e honráramos-lhe os sacrifícios na construção e definição da fronteira daquilo que é ser português. É fazermo-nos ouvir e defendermos o nosso retângulo sem projéteis. Aliando atitude a palavras, juntas são uma grande arma em que a língua não é petróleo, é a força persistente que acorda os dormentes e os coloca no combate à incompetência que tem perpassado até ao quotidiano.
Nas palavras de Eduardo Lourenço, é impressionante o caracter pacifico que modificou a atualidade. Demonstrou ser necessário resolver a crise dando um outro sentido de rumo ao país, à europa e se ainda for possível ao mundo. O dia quinze como afirma Freitas do Amaral revela que as manifestações não mudaram o país, financeiramente, mas a classe política (re)tomou a perceção do país interventivo. Terra e povo estão saturados de medidas erradas e desajustadas à realidade nacional em que os governos se sucederam no esquecimento da existência das pessoas (por si só) e estas têm observado as suas vidas serem hipotecadas sob a batuta de um termo (troika) estranho e estrangeiro, qual papão executor da vontade dos dinheiros capitais.
Quinze foi o dia da voz portuguesa soberana que se fez ouvir e se afastou da passividade.