terça-feira, 25 de setembro de 2012

Sementes de Cravo


Olhei para a revolução do 25 de abril, um miúdo na data,  a quem dão um presente e lhe dizem que só poderia ser bom e só havia aquele para oferecer.
Durante vinte e cinco anos olhei para a obra e julguei que a geração, minha progenitora, poderia ter ido mais longe e que teria tido a oportunidade de proceder proficuamente. Achei que o facto de os cravos simbolizarem o movimento que arrastou massas se tinha tornado fraco. Por vezes substituí no meu imaginário social o cravo pela rosa na magoada sensação de que uma gota de sangue picado por um qualquer espinho acabaria por provocar o abanão final ao país.
Olhava o horizonte na tentativa de encontrar um vislumbre iluminado. Deparei-me constantemente com grilhões político-sociais de controlo confortante através dos subsídios, de amarras contratuais que subtilmente nos demovem e afastam da participação da vida sociopolítica do país e encarei-me com uma classe, feita, política interveniente ineficazmente que olhou para a aceitação eleitoral, como um objetivo superior, e permitiu esvair-se da clarividência corajosa e de ser capaz previamente de tomar as decisões certas para encarrilhar o Estado na linha onde as agulhas das receitas e das despesas se cruzariam e não chocavam.
O sete e o quinze serão números ditantes de sortes diferentes. O sete será a sombra e o calafrio deste país. Viriato Soromenho Marques poderá equivocar-se e não estaremos a ver o fim da terceira república, a menos que o governo insista em divorciar-se da população. No entanto, o primeiro-ministro alcançou a proeza de unir os trabalhadores, os sindicatos e os patrões contra as suas medidas de austeridade. O quinze é o mais importante. Representa o dia em que vislumbrei as sementes dos cravos e esqueci os espinhos da rosa. As setas contorceram-se em todas as direções e o mundo viu de que fibra é feita este povo. Entre verdades e impropérios o pacifismo popular foi revoltoso. Mãos sensuais mas fortes, sorrisos sedutores mas determinados, pés cansados mas firmes, vozes ensurdecedoras mas conectadas num só sentido presentearam os gigantes históricos que carregamos às costas e honráramos-lhe os sacrifícios na construção e definição da fronteira daquilo que é ser português. É fazermo-nos ouvir e defendermos o nosso retângulo sem projéteis. Aliando atitude a palavras, juntas são uma grande arma em que a língua não é petróleo, é a força persistente que acorda os dormentes e os coloca no combate à incompetência que tem perpassado até ao quotidiano.
Nas palavras de Eduardo Lourenço, é impressionante o caracter pacifico que modificou a atualidade. Demonstrou ser necessário resolver a crise dando um outro sentido de rumo ao país, à europa e se ainda for possível ao mundo. O dia quinze como afirma Freitas do Amaral revela que as manifestações não mudaram o país, financeiramente, mas a classe política (re)tomou a perceção do país interventivo. Terra e povo estão saturados de medidas erradas e desajustadas à realidade nacional em que os governos se sucederam no esquecimento da existência das pessoas (por si só) e estas têm observado as suas vidas serem hipotecadas sob a batuta de um termo (troika) estranho e estrangeiro, qual papão executor da vontade dos dinheiros capitais.
Quinze foi o dia da voz portuguesa soberana que se fez ouvir e se afastou da passividade.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

SUBLIMAÇÃO


Estou numa luta para não escrever uma palavra “feia”… porque quero, mas sinto nas minhas entranhas que esta palavra não preenche os cânones de um enquadramento convencional na transmissão de boas ideias. Nem sempre estamos baseados em algo explicado á luz da boa convivência social e mesmo…

Lutamos por sermos… sermos simplesmente sem subterfúgios, sem imaculadas presenças na vida de outros porque não existimos para sermos outros, não existimos para que nos façam imagens plasticinadas de cores amareladas pelo tempo, que rodopiaram pelo pensamento de um qualquer que pretenda um dom de midas e tocar a magnitude da vida alheia… alheia às pertenções individuais.

Pelas minhas extremidades soltam-se repulsas evaporadas, que exprimidas nada valem, no entanto proferidas por alguém que consideramos ter uma genética quase igual fazem doer. Não uma dor simples e natural, antes aquela que provoca um esfreganço momentâneo… mas que irá perdurar muito mais do que a memória poderá comportar. Será algo, que mastigado não manifestará algum sabor, pois a importância será relativa e nada construtiva.

Tivesse a magnitude capaz de me iluminar simplesmente com um indicador… teria de certo várias cores da imagem que me mostram a negro. Já não me lembro da palavra que serviu de mote para esta dicotomia. Se não há recordação será porque tem um ínfimo valor patrimonial, não confundamos a matéria com outra valia mais profunda!

Tivesse eu a capacidade volátil… alcançasse asas reais, mesmo fustigadas por nuances do enraizado complexo de Édipo e sombreadas pelo ímpeto de Nero, não queimaria nem Roma nem Pavia, não me substituiria por um qualquer pai, reuniria reflexos em retrocesso dos passos calados e quietos de quem premeia a virtude acessível, pouco transpirada, e iria colocá-los às portas de elfos.

Gostaria que a beleza se transformasse numa sensível fertilidade… de exemplos capazes de se envolverem pelos espaços naturais resplandecendo o belo sob a terra, sobre as florestas e que os arqueiros se transformassem nos guias transversais das pegadas que ainda teremos de cravar no solo barrento deste nosso planalto.

Tivesse eu ainda alma neste momento… gritaria alto um murmúrio abafado que escorre pelas artérias, que me faz esmorecer o Cérebro e embeber de compaixão, quando não tenho apetência esclarecida sobre a validade… quem percorre as vãs carreiras hexagonais de um favo de colmeia abandonado nada mais encontra que algo semelhante ao labirinto de Creta.

Encontrei no meu bolso o fio esticado que irá derrotar Dédalo e escapar ao Minotauro… só me resta saber se me está reservado o desempenho de Teseu… e para assim ser capaz de iniciar a fuga às trevas, reencontrar e vislumbrar o renascimento pessoal.

Também neste contexto… eu quero a minha superação, o encontro da verdade e de um opus sublime!

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Sobreposição de Elementos


Praia do Zavial - Vila do Bispo - Algarve Portugal

Cascata Perpétua


Fraga da Pena - Serra do Açor - Portugal

UMA VIDA


Uma vida!

Uma vontade!

Uma força revelada num olhar vago de quem procura um sentido onde não é possível encontrá-lo. A esperança não tem aqui lugar.

Não consigo. Não tenho a chave das amarras.

Não posso!

Não quero acreditar numa medida igual. A oportunidade de viver é diferente. Na existência alheia a todas as engrenagens da vida leiloamos os nossos dias numa roleta de pouca sorte. Os ditames traçados vão mais longe do que o entendimento pode alcançar.

O conforto já não é procurado no divino. Porque se existe é cruel. É cruel por fazer sofrer um ser mais do que a sua capacidade aguenta. A conciliação e a pacificação são difíceis. A revolta impotente cresce no olhar. Paira no ar um encerramento de muitos capítulos. Alguns recordados com prazer carregam a saudade e o vazio futuro. As memórias perpetuam antes do tempo em que seriam autorizadas a manifestarem-se.

Temos vida, temos xisto negro, angústia e a areia escorrega para o outro lado da ampulheta. Tivesse eu força e poder para a virar antes do último grão. Conseguisse a metamorfose de mariposa daria a tantos outros a felicidade impossível de ver neste olhar.

Resta… resta muito pouco. Nem a resignação tem lugar aqui.

Não consigo.

Sou impotente perante ela… a última batalha continua a ser dela.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Contorno Perpetuo


Caminho na retaguarda do tempo. Conto as pedras soltas da praia exposta ao mar do norte na tentativa de encontrar o número par, que justifique a minha existência. Ambiciono fugir da tua loucura diária… de colocares tudo nos mesmos lugares de sempre, alinhado por épocas e momentos do menos para o mais importante, como se tudo fosse interligado pela medida ordenada.

Nada pode ficar fora do contorno estabelecido. Nada é uma parte de um todo e nem o teu todo é a súmula das nossas partes.

Mostro na palma da mão uma perspectiva possível do objecto que nos pode unir. É um laço que perpétua a relação e a mantém viva. Pouco vale… há engrenagens. Se virar a mão para te mostrar tudo isso irás ver que virada ao contrário simboliza aquilo que não procuras… pode transformar-se num desalento!

Alimento as energias com a vontade de ir mais além, numa tentativa…, quase frustrada, de saltar a margem e me tornar um persistente nesta sociedade com laivos de perdição individual.

Estes dedos que trauteiam a música que ouvimos juntos querem agarrar algo sólido, que seja possível transformar no futuro sobre a cristalização do passado. Que seja possível representar a fuga evolutiva de tudo o que somos e dos caminhos que tivemos de construir para aqui chegarmos. E olhamos o céu com intenção de lá encontrarmos o guia, de lá vermos o conforto dos exemplos já experimentados.

Sabemos as semelhanças que existem. Sabemos as possibilidades de marcar o presente com os pilares do futuro, no entanto olhamos o céu na esperança de lá vir a sair o escrutínio ideal capaz de nos substituir na reconstrução do futuro, que nossos pés irão pisar.

Fecho o punho. Escondo uma imagem que não conheço. Vasculho as memórias. Transporto-me psicoticamente neste vaivém de tentativas. Nada me é familiar. Nada me surge ordenado e tudo se atira a mim como inimigo do conforto das representações do quotidiano. Desmanchou-se o exército de terracota. Alguns pedaços de barro têm as arestas cortantes. Parece defenderem-se da mão grande sobranceira. Olho dentro deste cenário como um estranho que tropeçou nele e por nada se compromete com a reconstrução do trilho.

A linha longínqua que imagino ver no horizonte (de olhos fechados nada vejo e tudo posso criar) torna-se rapidamente na âncora do desejo frenético de sair a galope e sorrir.